Certa vez, li um texto da escritora Martha Medeiros falando sobre o quanto algumas pessoas podem ser inconvenientes com os outros, inclusive com aquelas que mais nos querem bem. ‘Ah, se conseguíssemos manter sob controle nosso ímpeto de apoquentar’, disse ela em seu artigo. Que atire a primeira pedra quem nunca se viu transformando uma coisa pequena, aparentemente simples, em um problemão, a ponto de encher os olhos do outro de piedade.
Quantas e quantas vezes reduzimos a história de vida do colega a nada, só para emancipar a nossa? ‘Uns mais, outros menos, todos passam do limite na arte de encher os tubos.’Confesso que tenho me cansado frequentemente com algumas experiências em redes sociais e acredito que essa tarimba não seja somente minha. Me sinto exausta ao ver as incontáveis selfies que aparecem diariamente na minha timeline, sempre acompanhadas de ‘cutucadas’, mensagens subliminares ou indiretas amorosas.
Há os amigos ‘taxa zero de problemas’, felizes e viajantes, que nem sabem qual é o dia da semana porque não precisam trabalhar duro para garantir o pão de cada dia. Que sorte a deles! Há, ainda, uma exaustão de músculos, correntes do bem, textos bíblicos e motivacionais, modelinhos de cabelos, carros, batons, roupas. É uma imensidão de vaidades em um ambiente criado para isso. Resta saber como cada um desejará ser lembrado.Deveria ser crime inafiançável alugar os amigos para reclamar da vida. ‘Duvido que isso dará certo’, ‘o Brasil nunca vai melhorar’, ‘você teve sorte’, ‘é bem difícil resolver isso’, ‘nunca serei feliz no amor’, ‘o mundo está contra mim’.
Conselhos estão liberados, afinal, demonstram carinho e confiança, mas passar o dia falando mal de alguém, contando casos de doenças ou arrumando desculpas para atestar a veracidade do tamanho de sua cruz, é de doer. Se olhássemos para a dor de outras pessoas, para a dor do mundo, sentiríamos constrangimento por tantas lágrimas tolas.Porteiros, garçons, motoristas e coletores de lixo foram treinados para nos querer bem. Eles não são responsáveis se acordamos atrasados, se o ingrediente do risotto veio errado, se o trânsito travou ou se a rua está suja. Educação e gentileza são fundamentais. Todo mundo gosta e merece. Não peça dinheiro emprestado, alegando que vai pagar no dia ‘x’ e depois finja demência, como se nada tivesse acontecido. Não minta dizendo que vive sem internet no celular só para o amigo ‘ponta firme’ tomar a iniciativa de pedir um Uber no final da festa. Não amole seu namorado(a) discutindo a relação por qualquer bobagem.
Não queira ter sempre razão e comprovar, insistentemente, que seu ponto de vista está correto, finalizando o diálogo com a típica e nada criativa frase: ‘Eu te avisei, eu já sabia’. Não tente ajeitar encontrinhos amorosos para seus amigos. Você pode até conhecer pessoas interessantes, mas acredite, não existe coisa mais chata do que o mundo tentando te desencalhar. Não seja indiscreto e intrometido. Pessoas que insistem em perguntar: ‘quando você vai casar’, ‘quando vai ter filhos’, ‘quando vai mudar seu estilo’, ‘quando vai emagrecer/engordar’ deveriam ser levadas a cadeira elétrica.
Quando amamos alguém, por mais que a pessoa esteja sendo inconveniente ou desapropriada, fazemos de conta que estamos nos divertindo somente para não desapontar. Erramos. Amar também é saber a hora de puxar a orelha, de dizer que está exagerando ou que as piadas estão passando dos limites. Prive-as de passar por certos infortúnios. Por fim, não seja raso com quem mergulha fundo com você. Não desapareça, nem evapore como uma nuvem branca que segue os rastros de um avião. Não trate quem te quer bem como descartável. Quem te quer bem vai entender suas decisões, mesmo que elas gerem sofrimentos. Quem te quer bem, te quer bem perto ou longe, e não tem culpa de gostar de você.
Por Camila Garcia
Fonte: Portal Mundo Maior
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